Cineastas acreditam que “é um primeiro passo para uma melhor representatividade no Oscar”, destacando três filmes sobre pessoas com deficiência
No dia 25 de abril, a 93ª cerimônia de entrega do Academy Awards – apresentada pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas – homenageará os melhores filmes lançados entre 1 de janeiro de 2020 e 28 de fevereiro de 2021. Entre os indicados da premiação do Oscar 2021 ↗, em Hollywood, estão três filmes sobre pessoas com deficiência, sendo um documentário, um drama e um curta-metragem com pouco mais de 18 minutos.
Boa leitura!
Representatividade PcD no Oscar
Neste ano, a cerimônia de três horas será realizada no Union Station, em Los Angeles, com os indicados socializando ao ar livre. Com dois meses de adiamento devido a pandemia, a premiação acontece somente uma semana após a Califórnia liberar as vacinas contra a COVID-19 para todos acima dos 16 anos, com as taxas de infecção despencando.
Transmitida nesse domingo, a maior premiação do cinema conta com um filme sobre um baterista com perda auditiva que concorre ao prêmio de melhor filme, um documentário indicado que explora um acampamento hippie para jovens com deficiência e o primeiro filme protagonizado por um ator surdocego.
O Som do Silêncio (Sound of Metal)
A produção, que retrata a história de um baterista que começa a perder a audição, recebeu seis indicações, entre elas a de melhor filme. Sua estreia mundial aconteceu no Festival Internacional de Cinema de Toronto em setembro de 2019. Foi lançado nos cinemas em novembro de 2020 e transmitido no Amazon Prime Video, em dezembro do mesmo ano.
Sinopse: Em Sound of Metal, um jovem baterista teme por seu futuro quando percebe que está gradualmente ficando surdo. Duas paixões estão em jogo: a música e sua namorada, que é integrante da mesma banda de heavy metal que o rapaz. Essa mudança drástica acarreta em muita tensão e angústia na vida do bateirista, atormentado lentamente pelo silêncio. Não recomendado para menos de 16 anos.
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Crip Camp: Revolução pela Inclusão (A Disability Revolution)
Concorrendo ao prêmio de Melhor Documentário, a produção original Netflix é sobre um acampamento hippie de verão para pessoas com deficiência, que transformou a vida de um grupo de adolescentes e ajudou a mudar os direitos civis americanos.
Sinopse: Em Crip Camp: A Disability Revolution, ninguém no acampamento Jened poderia imaginar que aqueles verões juntos na floresta seriam o começo de uma revolução. No final da estrada de Woodstock, o Camp Jened era um acampamento para adolescentes com deficiência. Um grupo de campistas e ativistas moldaram o futuro do movimento dos direitos da pessoa com deficiência e mudaram a legislação de acessibilidade para todos. Não recomendado para menores de 14 anos.
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Feeling Through (sem tradução em português)
Produção americana de 2019 é o primeiro filme protagonizado por um ator surdocego, indicado ao Oscar de 2021 na categoria de “Melhor Curta Metragem”. Dirigido por Doug Roland, conta a história de um jovem desabrigado que conhece um homem cego e surdo em uma noite de Nova York.
Sinopse: Feeling Through acompanha o jovem Tareek enquanto ele caminha pelas ruas de Nova York depois de uma festa. No caminho, o rapaz encontra o homem surdocego com uma placa pedindo ajuda para atravessar a rua. Os dois acabam passando parte da noite juntos e criando uma inesperada amizade. Não recomendado para menores de 14 anos.
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Representatividade PcD
De acordo com a Agence France-Presse (AFP), os cineastas indicados acreditam que “é um passo para a representação de pessoas com deficiência em Hollywood. Um avanço que precisa de um trabalho contínuo para evitar que seja um acontecimento raro nas nossas telas, como já ocorreu antes”, publicou.
Até agora, no entanto, os produtores de Hollywood “não fizeram um bom trabalho, e eles sabem disso, estamos tomando ciência disso”, disse o ator Paul Raci. Indicado como melhor ator coadjuvante por ‘O som do silêncio’, apesar de ter deficiência, Raci foi criado por pais surdos.
“Sou um dos caras que têm que estar à frente para não deixar a bola cair… mantendo-os atualizados sobre todos os artistas surdos que temos, todos os artistas com deficiência, todos os gênios que estão por aí, todas as histórias não contadas”, disse Raci à AFP.
A cautela é compreensível. Este é um caminho que Hollywood já tentou percorrer antes, mas com pouca sensatez. Em 1948, Jane Wyman ganhou um Oscar por interpretar uma mulher surda em “Johnny Belinda”, um papel extremamente irritante, segundo Raci.
O verdadeiro progresso aconteceu em 1987, quando a atriz surda Marlee Matlin ganhou o Prêmio da Academia por “Filhos do Silêncio”. Mas até pouco tempo, essa foi uma exceção, mesmo quando Hollywood deu grandes passos no conteúdo que envolve questões das comunidades negra e LGBTQIA+.
“Muitas vezes, o grupo de pessoas com deficiência é deixado para trás enquanto outros sub-representados recebem atenção”, disse Doug Roland, diretor do curta-metragem indicado ao Oscar ‘Feeling Through’.
Roland, que não tem deficiência, inspirou seu curta-metragem em um encontro noturno que teve com um homem surdocego que precisava de ajuda para atravessar uma rua em Nova York.
Para sua obra, escolheu o ator estreante Robert Tarango, a primeira pessoa surdocega com um papel protagonista em qualquer filme, segundo os cineastas. “Essa conversa realmente começou a mudar muito significativamente para a comunidade de pessoas com deficiência, e estamos ouvindo vozes mais fortes”, disse Roland.
Contra os preconceitos
No entanto, a representação da deficiência é uma ascensão no entretenimento que esbarra em preconceitos “muito profundos e difíceis de identificar”, afirmou Roland. Essa comunidade “é frequentemente vista como ‘menos que’ de uma forma mais severa do que outras comunidades”, ou até mesmo “quase como desumana”, disse à AFP.
Raci, que interpreta em “O som do silêncio” um conselheiro de vícios que perdeu a audição em uma idade avançada, considera que “as pessoas temem o desconhecido”. “A surdez é uma deficiência oculta, ninguém carrega uma placa que diz ‘sou surdo'”, acrescentou.
Outro obstáculo para os atores com deficiência é o acesso físico aos estúdios e locais de gravação, que nem sempre são equipados ou adaptados, por exemplo, para cadeiras de rodas ou pessoas cegas.
Um quarto da população mundial tem algum tipo de deficiência.
É a “maior população minoritária do mundo”, mas apesar disso ainda é muito pouco representada, inclusive no Oscar deste ano, disse o ator Nic Novicki, que em 2013 iniciou um reconhecimento que exigia pelo menos um membro do elenco ou da equipe com alguma deficiência e que agora se transformou no Easterseals Disability Film Challenge.
Protestos e pandemia
Os protestos que têm sacudido os Estados Unidos também geraram mudanças na Academia. Especialistas apontam que crescimento expressivo das plataformas de streaming durante a pandemia também é parte do processo, “porque a diversidade na televisão aumentou muito mais rápido que no cinema”, de acordo com publicação do G1.
Além das pessoas com deficiência, atores negros como favoritos em várias categorias, mulheres e cineastas de origem asiática na disputa pelo prêmio de direção, indicam que este ano o Oscar bateu o recorde de diversidade, e não apenas graças à pandemia que mudou os planos de Hollywood.
Um dos fatores da mudança foi a reforma iniciada pela Academia, que organiza a premiação de maior prestígio do cinema americano, para ampliar o número de membros e fazer com que reflitam mais o conjunto da sociedade.
“Acho que este Oscar será lembrado como aquele em que as mudanças introduzidas no corpo de eleitores há seis anos, graças ao #OscarsSoWhite, cumpriram as promessas de reforma da Academia”, disse o ator negro Dwayne Barnes, para o site especializado Deadline.
FONTES:
- Oscar 2021: www.oscars.org ↗
- ABC Television Network: abc.com ↗
- Agence France-Presse (AFP): www.afp.com/pt/noticias ↗
- G1 (Globo): g1.globo.com ↗
- Noticias da TV (UOL): noticiasdatv.uol.com.br ↗
- Estadão: estadao.com.br ↗
Editor na Jornalista Inclusivo e na PCD Dataverso. Consultor em Estratégias Inclusivas e Gestor de Mídias Digitais. Formado em Comunicação Social (2006). Atuou como repórter, assessor de imprensa, executivo de contas e fotógrafo. Ativista dedicado aos direitos da pessoa com deficiência, redator na equipe Dando Flor e na Pachamen Editoria.
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