Escassez de material didático em braille prejudica educação inclusiva no Brasil

Criança com deficiência visual em sala de aula, usando uma telelupa monocular. Em sua mesa se vê algum material didático em braille.
“Com tantos avanços tecnológicos, por que o material didático em braille ainda não chegou para nossas crianças cegas?” – Beto Pereira, presidente da Organização Nacional de Cegos do Brasil. (Foto: Arthur Calasans / Instituto Paradigma)

Segundo o último censo do IBGE, existem no Brasil mais de 6,5 milhões de pessoas com deficiência visual severa, sendo 582 mil cegas e 6 milhões com baixa visão. 

A Organização Nacional de Cegos do Brasil (ONCB) , que representa 100 entidades de todo o país, denuncia a persistente escassez ou ausência total de livros em braille e materiais didáticos adaptados para crianças e adolescentes cegos ou com baixa visão na rede escolar. “Ano após ano, as pessoas com deficiência se deparam com uma lacuna significativa em sua jornada educacional”, afirma Beto Pereira, presidente da ONCB.

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A Luta pela Educação Inclusiva: Escassez de Material Didático em braille

Questionado pela Redação, o sociólogo Beto Pereira explica que essa problemática não se limita a uma região específica, é uma realidade que transcende as fronteiras das pequenas, médias e grandes cidades, incluindo as capitais. “Apesar de uma ligeira melhoria na agilidade de atendimento, a insuficiência persiste”, acrescenta Pereira.

Relatos e escutas realizadas por entidades dedicadas à causa revelam uma demora crônica na entrega desses materiais essenciais, colocando em xeque a efetividade das políticas públicas destinadas a assegurar uma educação verdadeiramente inclusiva.

“Como pode, no ano de 2024, com tantos avanços tecnológicos e recursos disponíveis, aceitarmos que crianças e adolescentes com deficiência visual ainda enfrentem tais barreiras na sua educação?”, questiona Pereira, consultor em inclusão, acessibilidade e diversidade humana da Laramara — Associação Brasileira de Assistência à Pessoa com Deficiência Visual — que recebeu inúmeras reclamações de outras organizações e de responsáveis por crianças e adolescentes cegas.

Uma narrativa emocionante foi compartilhado por uma psicóloga, que ao dialogar com um pré-adolescente de 11 anos, descobriu que o que ele mais valorizava na escola era a convivência pacífica entre estudantes com e sem deficiência. Contudo, a angústia de não ter acesso ao livro didático em braille desde o início do ano letivo se destacava como sua maior aflição. Para o consultor da Laramara, “este relato não é um caso isolado, mas sim um reflexo de uma dor comum a muitas pessoas, evidenciando um tratamento desigual que contradiz a promessa de inclusão.”

Beto Pereira, presidente da Organização Nacional de Cegos do Brasil, alertando a falta de material didático para crianças com deficiência visual.
Descrição da imagem: A imagem mostra Beto Pereira, presidente da Organização Nacional de Cegos do Brasil e consultor em inclusão, acessibilidade e diversidade humana da Laramara. Ele está em pé em frente a um pano de fundo que exibe logos e textos relacionados ao evento ‘I FÓRUM INTERCONSELHOS PPA PARTICIPATIVO’. Beto está vestindo uma camisa verde clara e calças escuras, e parece estar segurando algo em sua mão. (Foto: Laramara)

A urgência de se garantir a igualdade de acesso ao conhecimento é corroborada por uma mobilização crescente entre organizações nacionais, que levam suas preocupações e demandas a instâncias superiores, incluindo o Ministério da Educação (MEC) e o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade). Estes esforços visam não apenas evidenciar as lacunas existentes, mas também pressionar por mudanças concretas que assegurem a entrega tempestiva de materiais didáticos adaptados.

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Logística e Planejamento Inadequados: Um Cenário do Brasil que Preocupa

A raiz do problema parece residir na logística e planejamento inadequados, com a adaptação e transcrição de conteúdos sendo iniciadas tardiamente, resultando em atrasos inaceitáveis na entrega dos materiais. 

“Para romper esse ciclo, é essencial um comprometimento maior dos responsáveis pela educação, assegurando que os materiais em braille e adaptações para baixa visão sejam priorizados e preparados com a devida antecedência e qualidade”, defende Pereira.

Esse desafio não é apenas uma questão de logística, mas um teste para o compromisso da sociedade com a educação inclusiva. “A alfabetização e o acesso ao conhecimento são direitos fundamentais que definem a trajetória de vida de cada criança e adolescente, independentemente de suas condições físicas”, ressalta Pereira.

Em última análise, a luta por materiais didáticos acessíveis para estudantes com deficiência visual é um reflexo mais amplo da luta por uma sociedade verdadeiramente inclusiva. 

“Uma sociedade que reconhece e valoriza a diversidade, que se compromete com a igualdade de oportunidades e que se esforça incansavelmente para garantir que cada criança e adolescente possa aprender, crescer e prosperar, independentemente de suas limitações físicas. A hora de agir é agora, pois cada dia de atraso é um dia perdido na educação e na vida desses jovens”, conclui Pereira.

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Rafael F. Carpi

Editor na Jornalista Inclusivo e na PCD Dataverso. Formado em Comunicação Social (2006), foi repórter, assessor de imprensa, executivo de contas e fotógrafo. É consultor em inclusão, ativista dedicado aos direitos da pessoa com deficiência, e redator na equipe Dando Flor e na Pachamen Editoria.

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