Consultores defendem que ações propostas pelo Ministério da Educação incluam adaptações arquitetônicas, comportamentais e de conteúdo.
O anúncio do governo federal em destinar aproximadamente R$ 3 bilhões nos próximos quatro anos para aprimorar o acesso e o aprendizado de estudantes com deficiência em escolas regulares tem despertado expectativas renovadas de inclusão e oportunidade para quem vive a causa ou luta por ela.
Entre as medidas, que englobam também a capacitação de professores, são parte do atual Plano de Afirmação e Fortalecimento da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI), divulgado recentemente pelo Ministério da Educação, no dia 21 de novembro ↗.
Especialistas, tanto em políticas educacionais quanto em soluções de acessibilidade, concordam com a urgência das propostas, mas ressaltam que elas demandam mudanças drásticas que não podem ficar apenas no discurso.
Valmir de Souza, sócio-fundador da startup Biomob e diretor de operações do Instituto Biomob, especializados em acessibilidade para empresas e consultoria em projetos sociais, destaca:
“O Governo deu um grande passo, mas para que haja uma troca de experiências entre as pessoas com e sem deficiência, a escola regular chamada de ‘escola inclusiva’ necessita de algumas adaptações em diversos aspectos: arquitetônicos, de conteúdo e, às vezes, até comportamental, para que as performances de todos os alunos sejam equiparadas de forma justa, e para que os alunos sem deficiência saibam como se comportar perante aos alunos com deficiência”.
Educação inclusiva na escola regular: Salas de Recursos Multifuncionais
A proposta do Governo é dobrar o número de escolas que recebem recursos para Salas de Recursos Multifuncionais, alcançando 72% dos estabelecimentos. A criação de 27 observatórios de monitoramento e o lançamento de seis editais para pesquisadores com deficiência também foram objetivos incluídos.
O diretor do Biomob defende ainda que as reestruturações aconteçam em todos os níveis da formação dos cidadãos para que as oportunidades realmente existam. “Outro grande desafio é a qualificação profissional, e isso pode sempre ser aprimorado desde o ensino de base”, avalia Valmir de Souza.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) dão conta de que das mais de 18 milhões de pessoas com deficiência no Brasil, apenas 29,2% estão inseridas no mercado de trabalho.
Francisco Borges, mestre em Educação e consultor de gestão e políticas públicas voltadas ao ensino da Fundação de Apoio à Tecnologia (FAT), espera que o Ministério da Educação tenha mais clareza nas propostas e garanta que os alunos que necessitam da educação especial não terão suas dores reforçadas.
“Por trás de um discurso de inclusão, o MEC não diz explicitamente como as diferenças serão trabalhadas, para que elas não gerem desconforto, incômodos e feridas. É algo bonito de se ouvir, mas não podemos desconsiderar as dificuldades de implantar tais propostas sem tecnologia, sem especialistas, sem docentes preparados e com jovens alunos, muitas vezes, não empáticos”, diz.
"Oportunidades (acadêmicas e sociais) perdidas"
O empresário Anderson Belém, hoje à frente da Otimiza Benefícios, viveu essa realidade durante todo o seu processo educacional. Diagnosticado com TDAH e Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD) do tipo produtivo-criativo apenas aos 40 anos, ele avalia que sua caminhada foi repleta de mal-entendidos e oportunidades perdidas.
“Desde cedo enfrentei dificuldades na escola. Não apenas acadêmicas, mas também sociais, como o bullying e a incompreensão dos professores e colegas. Isso me levou a desenvolver um temperamento agressivo como mecanismo de defesa, culminando em diversas situações problemáticas. Integrar alunos de educação especial em classes regulares é um passo positivo, mas requer um planejamento cuidadoso e sensível”, lembra.
Para ele, a proposta de preparar principalmente os docentes para lidar de forma adequada deve ser permanente:
“É preciso desmistificar os transtornos, bem como a superdotação, e apresentar os benefícios da pluralidade e diversidade acima de tudo. Curiosamente a minha filha primogênita, Jessica, atua com criança diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista (TEA) Nível de suporte 3, em escola particular. Ela é graduanda tanto em pedagogia quanto em psicologia, desenvolve sua pesquisa nessa área, é entusiasta do avanço da neurociência e pesquisadora sobre neurodiversidade e, ainda assim, é surpreendida frequentemente com o mundo particular apresentado pela mente TEA”, conta o empreendedor.
Ainda de acordo com dados do IBGE, divulgados em 2022, estima-se cerca de 2 milhões de pessoas com autismo no País, aproximadamente 1% da população. A proposta do Governo Federal prevê a participação de estados e municípios no processo de implementação dos recursos de tecnologia assistiva e pedagógicos, além do investimento estrutural.
Da Equipe de Redação