Profissional explica os efeitos da “síndrome da covid longa” no campo cognitivo e funcional, que afetam 80% das pessoas de forma persistente nas atividades diárias.
Apesar de ser um grande motivo de comemoração quando alguém sai do hospital curado da fase aguda da COVID-19, poucos pacientes são orientados sobre os sintomas persistentes, a chamada “síndrome da covid longa”.
Mesmo quem passou pela doença com poucos sintomas pode enfrentar dificuldades maiores posteriormente. São consideradas assim as sequelas manifestadas após quatro semanas da infecção pelo coronavírus – e esses efeitos podem durar longos meses e comprometer a vida diária.
“Muitas vezes o paciente sai do hospital com um protocolo relacionado ao sistema respiratório e motor, mas ninguém fala da parte funcional – e a covid longa atrapalha as funções do dia a dia de muitas formas”, explica a terapeuta ocupacional Syomara Szmidziuk .
Ao todo, já foram catalogados mais de 50 sintomas dessa síndrome. A especialista, que tem atendido pacientes nessa situação, explica os principais sinais de alerta que podem afetar a rotina diária.
Em entrevista ao JI, a profissional com 30 anos de experiência ↗ também explica o que fazer no caso de pessoas em cadeiras de rodas, pessoas com deficiência intelectual, além dos riscos do Acidente Vascular Cerebral (AVC).
Sinais de alerta e 5 dicas para enfrentar a covid longa:
1. Esquecimentos
Quem não conhece alguém que se curou da fase aguda da COVID-19 e relata perda de memória? Essa tem sido uma das principais queixas da convalescença prolongada. “Os pacientes precisam estar mais preparados para o pós-tratamento, pois 80%, em média, tem enfrentado dificuldades cognitivas, ou seja, envolvendo o próprio raciocínio”, explica a terapeuta. Com recursos terapêuticos de atividades de vida diária, é possível treinar o paciente para essa nova realidade.
2. Menos concentração
A dificuldade em se concentrar é um dos principais empecilhos para quem se cura da COVID-19 e precisa retomar atividades profissionais logo depois. “Percebemos a ocorrência frequente de doenças neurológicas entre pessoas convalescentes da infecção por coronavírus, após um número elevado de dias de internamento, seguindo protocolos estritos de posição do corpo para melhor aproveitamento respiratório. Podem surgir lesões neuropáticas por compressão dos nervos, por exemplo”, ela explica. Para esses casos, a recomendação é o acompanhamento do neurologista e o trabalho persistente na terapia ocupacional.
3. Perda de força para atividades rotineiras
É comum o paciente sentir extrema fraqueza na vida diária durante a covid longa. Erguer uma garrafa, vestir-se e pequenos deslocamentos podem tornar-se um suplício. “São casos que requerem paciência e o acompanhamento do terapeuta”, explica Syomara. “Ouço muito a queixa de que o paciente já não consegue fazer o que fazia antes facilmente. Felizmente, existem recursos terapêuticos que permitem retomar as atividades de vida diária, mas eles exigem persistência.”
4. Sequelas neurológicas
Infelizmente, foram registradas sequelas neurológicas da COVID-19, que afetam o sistema nervoso central e periférico. Até mesmo o AVC pode ser uma decorrência da infecção pelo Coronavírus. Outra síndrome autoimune rara, mas que tem sido detectada em pacientes da covid longa é a de Guillain-Barret ↗, em que o corpo reage a agentes invasores como os vírus e traz fraqueza muscular e paralisia dos músculos. Por fim, a neuropatia central ou periférica, causada por compressão de nervos, tem trazido a falta de função de membros e, com isso, afeta todas as atividades de vida diária, seja de forma permanente ou não.
5. Fadiga extrema
Outro sintoma muito recorrente entre pacientes com a covid longa é o cansaço persistente. “Vejo pacientes com falta de ar, cansaço extremo em atividades que faziam normalmente, ou em que levam mais tempo para fazer, como caminhadas”, relata Syomara. Uma das técnicas que se mostra eficaz nesses casos é o RTA (reequilíbrio tóraco-abdominal), que tem como função trabalhar a respiração e o fortalecimento, com orientação do médico e do terapeuta.
Existem ainda muitas outras manifestações da covid longa, e a recomendação é a mesma:
“Procurar ajuda médica e do terapeuta ocupacional e não desistir do tratamento, pois juntos podemos superar tudo isso!”
Confira a entrevista:
- Quais são as orientações adequadas para quem desenvolve a covid longa?
Hoje existe um protocolo para quem é internado, desde o momento em que a pessoa sai do hospital. O paciente é encaminhado ao cardiologista, neurologista e médico respiratório. Os médicos estão orientados a encaminhar também à reabilitação, e o ideal é que ela seja multidisciplinar, com fisioterapeuta, fonoaudióloga, terapeuta ocupacional e psicólogo. Os sintomas mais relatados são perda de memória, fadiga crônica, perda de força muscular e alterações respiratórias. Em casos mais graves ocorre a neuropatia, mas a perda de sensações e sensibilidade também tem sido relatada. Os pacientes afirmam sentirem-se “envolvidos em um plástico”. Em casos mais leves, há queda de cabelo, insônia, depressão e, em casos mais graves, alucinações, pesadelos, confusão mental entre realidade e imaginação e até mesmo crises de ausência por alguns segundos, ou ainda crises convulsivas. Os pacientes que não foram internados ou mesmo assintomáticos também apresentam alterações ligadas à covid longa. É preciso estar muito atento a qualquer manifestação fora do normal e procurar o médico para encaminhamento.
- O que a terapeuta pode comentar a respeito das queixas desses pacientes?
Recebemos tanto queixas de lesões crônicas quanto passageiras, passando pelas motoras, sensoriais e cognitivas, com muitos casos de perda de força, queixa respiratória, dores não localizadas, enxaquecas e perda de memória. O que era uma exceção virou regra, tanto que os centros de reabilitação estão se unindo para criar protocolos multidisciplinares – porque a covid causa lesões multissistêmicas, e somente uma equipe completa consegue atender plenamente o paciente.
- O que dizer às pessoas com deficiência que usam cadeiras de rodas, por exemplo, e tiveram sintomas como perda de força e fadiga extrema?
Tanto para cadeirantes quanto pacientes crônicos, tem sido observado o aumento da espasticidade e fraqueza muscular, muita queixa respiratória, o aumento de crise convulsiva e alteração de paladar e olfato. A maioria dos meus pacientes tem dificuldade em relatar onde está sua queixa, então pedimos ao cuidador, aos pais ou quem está perto para relatar se ele está mais irritado, apresenta muito choro, com dor quando encostamos em certas partes do corpo, porque isso pode ser a covid longa. Também têm sido observadas crises de ausência, por vezes já tratados no passado e que voltam a ser frequentes.
Existe a probabilidade de acidente vascular cerebral devido a COVID-19? Por quê?
Sim, todas as doenças neurológicas aumentaram por conta da covid. Um dos motivos em estudos são as “tempestades de citocinas”, molécula que auxilia na recuperação do corpo. E como a covid é sistêmica, ela afeta sistemas que não seriam afetados normalmente, e isso pode trazer lesões. Existem ainda outras justificativas sendo estudadas, bem como os efeitos da covid entre crianças e jovens adultos, que têm se mostrado mais agressivos.
Pessoas com deficiência intelectual podem ter sequelas mais graves? Poderia comentar?
Entre pacientes com lesões já existentes, existem relatos de novas ocorrências. São relatadas muitas alucinações, mesmo entre jovens, além da convulsão e da sensação de “névoa” no cérebro, como se fosse necessária mais energia para fazer as mesmas tarefas. Esses pacientes estão sendo vacinados e foram muito protegidos pelas famílias.
SOBRE A TERAPEUTA
Syomara Cristina Szmidziuk atua há 30 anos como terapeuta ocupacional, e tem experiência no tratamento e reabilitação dos membros superiores em pacientes neuromotores. Faz atendimentos em consultório particular e em domicílio para bebês, terapia infantil e juvenil, para adultos e terceira idade. Desenvolve trabalho com os métodos RTA e terapia da mão, e possui treinamento em contenção induzida, Perfetti (introdutório), Imagética Motora (básico), Bobath e Baby Course (Bobath avançado), entre outros.
Editor na Jornalista Inclusivo e na PCD Dataverso. Consultor em Estratégias Inclusivas e Gestor de Mídias Digitais. Formado em Comunicação Social (2006). Atuou como repórter, assessor de imprensa, executivo de contas e fotógrafo. Ativista dedicado aos direitos da pessoa com deficiência, redator na equipe Dando Flor e na Pachamen Editoria.
Grato por comentar. Mas caspa tem alguma coisa haver com covid?
Amei seu post 🙂 Queria saber qual melhor tratamento para
cabelo com caspa 🙁