Conselho Federal de Medicina suspende resolução que restringe prescrição de remédios à base de Cannabis medicinal; advogada comenta o caso em entrevista
Após críticas e manifestações de entidades contra a Resolução nº 2.324/2022 ↗ que restringe a prescrição do canabidiol, o Conselho Federal de Medicina (CFM) comunicou a reabertura da consulta pública. O objetivo é contar com a participação da sociedade, pacientes e médicos nas discussões sobre a liberação de medicamentos com extraídos da Cannabis medicinal no País.
Boa leitura!
Consulta pública do canabidiol
No último 14 de outubro, o CFM anunciou a norma restringindo a prescrição do canabidiol para tratar apenas alguns quadros de epilepsia. Entidades e parlamentares pediram a derrubada da resolução, vista como retrocesso no tratamento de quem já utilizava derivados medicinais da planta.
Pessoas interessadas em participar da consulta pública têm até o dia 23 de dezembro para acessar o formulário e apresentar suas sugestões neste link ↗.
Dados da própria Anvisa mostram que mais de 100 mil pacientes fazem algum tipo de tratamento com a Cannabis medicinal. Só em 2021, mais de 66 mil medicamentos à base da planta foram importados. Diferente do Brasil, mais de 50 países já regulamentaram o uso medicinal e industrial da Cannabis e do cânhamo.
Como participar
Na plataforma do CFM ↗, o interessado poderá se posicionar sobre cada um dos artigos e parágrafos da Resolução. Para participar, deverá informar alguns dados de identificação, como o número de Cadastro Nacional de Pessoa Física (CPF), o Estado e município de residência.
Após acessar a ferramenta e preencher esses dados, o usuário será automaticamente conectado ao sistema, tornando-se apto a apresentar propostas de alteração ou manutenção de artigos.
As informações oferecidas serão tratadas sob os critérios de sigilo e anonimato, servindo de subsídios ao CFM. As contribuições podem ser encaminhadas por meio dessa plataforma entre os dias 24 de outubro e 23 de dezembro de 2022.
Constitucionalidade e ilegalidade
Nossa equipe conversou com a advogada Mérces da Silva Nunes, sobre a constitucionalidade da resolução, apesar da competência do CFM para normatizar a conduta do médico, no exercício da profissão.
“Essa Resolução, em princípio, não está em harmonia com o artigo 196 da Constituição Federal ↗ que dispõe que a saúde é um direito de todos. Eu acredito que, diante do grande número de pacientes que já fazem uso do canabidiol e do princípio da autonomia do médico de decidir, em conjunto com seu paciente, qual é o melhor tratamento, essa Resolução deverá ser revogada”, explica Mérces, do escritório Silva Nunes Advogados.
Também perguntamos como os pacientes que precisam do canabidiol podem recorrer e garantir o acesso ao medicamento.
“É muito provável que os médicos continuem prescrevendo canabidiol para os seus pacientes, mas se necessário, acredito que os pacientes devem procurar a Justiça para não sofrer qualquer interrupção em seus tratamentos”, aponta.
Sobre pacientes serem forçados a agirem na ilegalidade, sem a devida prescrição, a advogada Mestre e Doutora em Direito pela PUC/SP diz que “só há possibilidade de prescrição médica do canabidiol. Se o paciente estiver na iminência de sofrer qualquer prejuízo deve ingressar na Justiça”, conclui.
CFM suspende resolução
A norma publicada no Diário Oficial da União ↗, que segue suspensa até o final do ano, somente permite a prescrição do canabidiol para tratar a epilepsia refratária em crianças e adolescentes com síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut ou complexo de esclerose tuberosa. Para os demais tipos de epilepsia, a prescrição seria proibida.
Pessoas adultas e doenças como depressão, ansiedade, dores crônicas, Alzheimer e Parkinson não estavam cobertas pela resolução. O “retrocesso”, segundo entidades e ativistas, ainda proibia médicos de darem palestras e cursos fora do ambiente científico sobre o uso do canabidiol e de outros produtos derivados da Cannabis, assim como fazer divulgação publicitária das substâncias.
Esclarecimentos
Em nota pública, o CFM informou que tem compromisso com a prática médica segundo princípios éticos e de excelência. “O CFM compreende os anseios de pacientes e seus familiares com respeito ao tratamento de doenças, porém entende ser fundamental que todas as decisões sobre o uso ou não de determinadas substâncias sejam tomadas de forma isenta”.
Além de reforçar que suas decisões têm como parâmetros a Medicina Baseada em Evidências, o CMF diz estar comprometido com a transparência de suas ações e por isso encaminhará ao Ministério Público Federal todas as informações solicitadas sobre o processo que resultou na aprovação da Resolução nº 2.324/2022, que segue suspensa. Confira a íntegra da nota do CFM neste link ↗.
Processo de revisão
Na nota, o CFM afirma ter “centenas de contribuições de médicos” e entidades no escopo de consulta pública aberta em julho deste ano sobre o tema, que levou a elaboração da Resolução nº 2.324/2022 e “analisou quase seis mil artigos científicos” de periódicos nacionais e internacionais. “As conclusões apontam para evidências ainda frágeis sobre a segurança e a eficácia do canabidiol para o tratamento da maioria de doenças”, diz trecho da nota.
Na condução deste processo de revisão, a autarquia informa que agiu imbuída de suas responsabilidades científica, técnica, ética, legal e social.
“O Plenário do CFM considera prudente aguardar o avanço de estudos em andamento, cujos resultados vão ampliar – ou não – a percepção de eficácia e segurança do canabidiol, evitando expor a população a situações de risco”. Em paralelo, admite a autarquia, continuará aberta ao debate e, por meio de seus conselheiros e especialistas, seguirá acompanhando a evolução de estudos científicos relacionados ao canabidiol.
A consulta pública não tira a validade da Resolução nº 2.324/2022 ↗, que permanece em vigor, mas segue suspensa.
Acesse e contribua com a consulta pública neste link ↗.
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