Criança com nanismo é protagonista do próprio tratamento pediátrico

Bernard, uma criança com nanismo (acondroplasia), sentado em um banco de madeira com almofadas azuis, sorrindo e fazendo sinal de positivo.

Legenda descritiva: Bernard, uma criança com nanismo (acondroplasia), está sentado em um banco de madeira com almofadas azuis, sorrindo e fazendo sinal de positivo. (Foto: Acervo pessoal)

Crescendo em autonomia: A jornada de Bernard e o futuro da pediatria com práticas do “Cuidado Centrado na Criança”.

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    Boa leitura!

    Protagonista no tratamento pediátrico

    Imagine uma consulta médica onde a criança é a principal interlocutora, expressando seus sentimentos e participando ativamente das decisões sobre seu tratamento. Este cenário, longe de ser fictício, é a essência do “Cuidado Centrado na Criança” (CCC), uma abordagem humanista da pediatria conteporânea.

    O CCC representa uma mudança de paradigma: coloca a criança no centro do processo de cuidado, reconhecendo-a como pessoa capaz e detentora de direitos. Neste modelo, o foco se desloca das famílias para a criança, garantindo sua participação em todas as etapas do tratamento.

    Um estudo conjunto da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e da Universidade de Brasília (UnB)  destaca a importância de atender às necessidades específicas de cada criança e respeitar suas preferências. Esta abordagem não apenas melhora a eficácia do tratamento, mas também promove o desenvolvimento da autonomia e autoconhecimento da criança.

    A história do pequeno Bernard, um menino de 11 anos com acondroplasia, ilustra o poder do CCC na prática médica da atualidade. 

    Cuidado Centrado na Criança (CCC)

    Como uma abordagem na assistência médica pediátrica, a prática do Cuidado Centrado na Criança (CCC) reconhece a importância de considerar não apenas as necessidades médicas da criança, mas também suas necessidades emocionais, sociais e de desenvolvimento.

    O que é o CCC?

    O CCC é uma filosofia de cuidado que:

    1. Respeita as preferências, valores e necessidades da criança e sua família.
    2. Promove a colaboração entre profissionais de saúde, pacientes e familiares.
    3. Encoraja a participação ativa da criança em seu próprio cuidado, de acordo com sua idade e capacidade.
    4. Enfatiza a comunicação clara e acessível entre a equipe médica e a família.
    5. Considera o contexto cultural e social da criança no planejamento do tratamento.

    Origens do CCC

    O conceito de Cuidado Centrado na Criança começou a se desenvolver na década de 1980, mas suas raízes podem ser traçadas até meados do século XX.

    • Quando: O termo “Cuidado Centrado na Família” foi introduzido na década de 1960, evoluindo para incluir o foco específico na criança nas décadas seguintes.
    • Onde: O movimento teve início principalmente nos Estados Unidos e no Reino Unido, mas rapidamente se espalhou para outros países desenvolvidos.
    • Como: O CCC surgiu como resposta a práticas médicas tradicionais que muitas vezes ignoravam as necessidades emocionais e psicológicas das crianças hospitalizadas. Estudos pioneiros, como o relatório Platt no Reino Unido (1959) , destacaram os efeitos negativos da separação entre pais e filhos durante internações hospitalares.

    Implementação do CCC

    A implementação do Cuidado Centrado na Criança envolve:

    1. Treinamento de profissionais de saúde para melhorar a comunicação com crianças e famílias.
    2. Criação de ambientes hospitalares mais acolhedores e adequados às crianças.
    3. Inclusão de crianças e famílias em rounds médicos e discussões de tratamento.
    4. Desenvolvimento de materiais educativos adaptados para diferentes idades e níveis de compreensão.
    5. Promoção de políticas hospitalares que apoiem a presença e participação da família.

    A história de Bernard ilustra perfeitamente como o Cuidado Centrado na Criança pode ser aplicado na prática, trazendo benefícios significativos para o paciente e sua família.

    Crescendo em autonomia: A jornada de Bernard

    Bernard, um menino de 11 anos diagnosticado com acondroplasia, uma condição genética rara e a forma mais comum de nanismo, decidiu comunicar à sua família seu desejo de iniciar o único tratamento medicamentoso disponível atualmente para sua condição. Seus familiares, que também carregam o gene da doença, atenderam ao pedido do garoto. Segundo sua avó, Kênia Rio, que também tem acondroplasia, a decisão foi tomada após considerar todas as complicações e desafios de saúde que pessoas com nanismo enfrentam ao longo da vida.

    Bernard, criança de 11 anos com acondroplasia, sorri enquanto segura um celular em um restaurante. Ele está usando um chapéu de cowboy e uma camiseta preta.
    Descrição da Imagem: Bernard, uma criança de 11 anos com acondroplasia, está sentado em uma mesa de restaurante, sorrindo para a câmera. Ele veste uma camiseta preta e um chapéu de cowboy, enquanto segura um celular com a tela de aplicativos visível. (Foto: Acervo pessoal)

    Estudos mostram que quase metade das crianças diagnosticadas com acondroplasia têm pernas curvadas para fora entre as coxas, os músculos e ligamentos ao redor dos joelhos, responsáveis por mantê-los no lugar e permitir o movimento, podem ser instáveis. Aproximadamente 50% das pessoas com essa condição experienciam dor crônica nas pernas antes de atingirem a idade adulta. Essas e outras questões de saúde podem ser extremamente dolorosas e emocionalmente desafiadoras para a criança. O medicamento disponível para o tratamento atua como um regulador positivo do crescimento ósseo e pode ajudar a amenizar esses problemas durante o desenvolvimento.

    A voz da criança com nanismo: independência

    Kênia compartilha que o desejo do neto de iniciar a terapia surgiu da sua convivência com outras crianças com acondroplasia e da conexão com a comunidade. Desde o início do tratamento, Bernard fez questão de aprender a aplicar a medicação por conta própria. “Essas ações mostraram que ele estava desenvolvendo sua independência e que realmente desejava o tratamento, sem medo de buscar o que precisava. Para nós, isso foi libertador,” comenta a avó.

    Uma nova era do tratamento centrado na criança

    Apesar do protagonismo não implicar necessariamente que a criança seja a responsável final pela decisão médica, suas escolhas devem ser respeitadas e priorizadas. Não considerar a autonomia e o desenvolvimento infantil, que a tornam capazes de contribuir ativamente em questões relativas à sua saúde, também implica em não a enxergar como uma pessoa de direito e de cuidado.

    Bernard é um exemplo claro de como a autonomia pode impactar positivamente a experiência de uma criança no sistema de saúde. Ele foi encorajado a expressar seus sentimentos e a participar das decisões sobre seu tratamento. Esse empoderamento não só o ajudou a enfrentar seus desafios médicos com mais confiança, mas também fortaleceu seu senso de responsabilidade e autoconhecimento. A abordagem centrada na criança garantiu que Bernard fosse ouvido e respeitado, o que resultou em um cuidado mais eficaz e humanizado.

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    Rafael F. Carpi

    Editor na Jornalista Inclusivo e na PCD Dataverso. Consultor em Estratégias Inclusivas e Gestor de Mídias Digitais. Formado em Comunicação Social (2006). Atuou como repórter, assessor de imprensa, executivo de contas e fotógrafo. Ativista dedicado aos direitos da pessoa com deficiência, redator na equipe Dando Flor e na Pachamen Editoria.

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