No Dia do Orgulho Autista, estudo revela crescimento alarmante de fake news e a importância da linguagem acessível para a inclusão.
Nesta quarta-feira, 18 de junho, Dia do Orgulho Autista, um alerta crucial emerge: a desinformação sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) no Brasil atingiu níveis alarmantes. Um estudo inédito conduzido pelo Laboratório de Estudos sobre Desordem Informacional e Políticas Públicas da FGV, em parceria com a Associação Autistas Brasil, revelou um crescimento de 15.000% em fake news sobre o tema entre 2019 e 2024 , colocando o país como líder latino-americano na disseminação de conteúdos falsos. Além dos riscos à saúde, o uso inadequado de termos como “hiperfoco” e “ressaca social” perpetua o capacitismo e dificulta a compreensão das experiências autistas.
Este cenário de desinformação não apenas compromete o entendimento público sobre o TEA, mas também coloca em risco a vida de pessoas autistas e suas famílias, que são expostas a promessas de “cura” e teorias da conspiração sem fundamento. Diante disso, a neuropsicóloga Bárbara Calmeto, diretora do Autonomia Instituto, esclarece o verdadeiro significado de termos frequentemente mal interpretados, visando promover uma linguagem mais precisa e respeitosa, essencial para a inclusão genuína e o combate ao capacitismo na sociedade.
O Cenário Alarmante da Desinformação sobre Autismo no Brasil
Em um mundo hiperconectado, a maior ameaça para muitas famílias de pessoas autistas não reside nos diagnósticos ou nos desafios do dia a dia, mas sim na tela do celular, disfarçada de conselhos, promessas e soluções mágicas. No Dia do Orgulho Autista, celebrado em 18 de junho, especialistas e ativistas acendem um alerta grave: o Brasil se tornou um dos principais polos mundiais de desinformação sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Um estudo inédito, conduzido pelo Laboratório de Estudos sobre Desordem Informacional e Políticas Públicas da FGV em parceria com a Associação Autistas Brasil, analisou mais de 58 milhões de mensagens em grupos do Telegram entre 2019 e 2024. Os resultados são impressionantes e assustadores: a desinformação sobre o autismo cresceu 15.000% nesse período . O Brasil lidera esse cenário preocupante, sendo responsável por quase metade (46%) dos conteúdos falsos detectados, o maior índice da América Latina.
Entre os absurdos que circulam, encontram-se desde promessas de “cura” com substâncias perigosas até teorias da conspiração sem fundamento algum. Essa proliferação de informações falsas não apenas compromete o entendimento correto sobre o TEA, mas, mais gravemente, coloca vidas em risco ao desviar famílias de tratamentos baseados em evidências científicas e promover práticas nocivas.
Desvendando Termos: A Importância da Linguagem Precisa no Autismo
Além das fake news, é comum observar o uso inadequado de termos relacionados ao Transtorno do Espectro Autista (TEA), o que pode levar a mal-entendidos e perpetuar o capacitismo sobre as experiências das pessoas autistas. Dois exemplos notáveis são “hiperfoco” e “ressaca social”, frequentemente empregados de forma trivial no cotidiano. Para esclarecer esses conceitos e destacar outras terminologias frequentemente mal interpretadas, a neuropsicóloga Bárbara Calmeto, diretora do Autonomia Instituto , explica o real sentido desses termos:
Hiperfoco: Mais que um Hobby, uma Imersão Profunda
O termo “hiperfoco” é frequentemente utilizado para descrever um interesse passageiro ou uma forte dedicação a uma atividade específica, como estar “viciado” em um novo jogo ou série. No entanto, no contexto do autismo, o hiperfoco representa uma concentração intensa e sustentada em um tema ou atividade específica, muitas vezes em detrimento de outras áreas da vida. Pessoas autistas podem mergulhar profundamente em seus interesses, dedicando tempo e energia significativos, o que pode dificultar a transição para outras tarefas ou a participação em interações sociais.
Bárbara Calmeto esclarece: “No autismo, o hiperfoco não é apenas um hobby ou passatempo; é uma imersão profunda que pode ser tanto uma fonte de prazer quanto um desafio, especialmente quando interfere nas atividades diárias ou nas responsabilidades.”
Ressaca Social: Esgotamento Profundo Pós-Interação
A expressão “ressaca social” tem sido usada coloquialmente para descrever o cansaço após eventos sociais, como sentir-se exausto depois de uma festa. Para pessoas autistas, entretanto, a ressaca social refere-se a um esgotamento profundo resultante de interações sociais, devido ao esforço necessário para navegar em normas sociais, interpretar sinais não verbais e lidar com estímulos sensoriais. Esse esgotamento pode levar a uma necessidade intensa de isolamento para recarregar as energias, impactando significativamente a capacidade de participar de atividades sociais futuras.
Segundo Calmeto, “a ressaca social em pessoas autistas vai além de um simples cansaço; é um esgotamento que pode exigir períodos prolongados de recuperação, durante os quais a pessoa pode evitar qualquer interação social para se recompor.”
Outros Termos Essenciais para Compreender o TEA
Além de hiperfoco e ressaca social, outros termos relacionados ao autismo são frequentemente mal interpretados, gerando equívocos e dificultando a compreensão das experiências autistas:
- Ecolalia: Muitas vezes interpretada como mera repetição de palavras ou frases sem propósito, a ecolalia no autismo pode servir como uma forma de processamento da linguagem ou uma estratégia de comunicação. Pessoas autistas podem repetir palavras ou frases para compreender melhor o que foi dito ou para expressar suas próprias necessidades.
- Meltdown: Comumente confundido com birras ou comportamentos desafiadores, o meltdown é uma resposta a uma sobrecarga sensorial ou emocional. Durante um meltdown, a pessoa pode perder temporariamente o controle devido ao acúmulo de estímulos ou emoções, resultando em comportamentos como choro intenso, gritos ou agitação física.
- Shutdown: Frequentemente negligenciado ou mal interpretado como desinteresse ou timidez, o shutdown ocorre quando a pessoa autista se retrai internamente em resposta a uma sobrecarga. Isso pode manifestar-se como silêncio repentino, imobilidade ou retirada de situações sociais, funcionando como um mecanismo de defesa para lidar com o estresse extremo.
Promovendo a Inclusão Através da Informação e Respeito
O uso inadequado de termos associados ao autismo pode minimizar as experiências das pessoas autistas e perpetuar equívocos sobre a condição. Bárbara Calmeto enfatiza que é fundamental que a sociedade compreenda o verdadeiro significado desses termos para promover uma inclusão genuína e oferecer o suporte necessário às pessoas autistas.
“Ao utilizar essas terminologias de forma precisa e respeitosa, contribuímos para uma maior compreensão e aceitação das experiências das pessoas no espectro autista, promovendo uma sociedade mais inclusiva e informada”, completa a neuropsicóloga.
Ajude a Combater a Desinformação Sobre Autismo
No Dia do Orgulho Autista, a luta contra a desinformação e o capacitismo se mostra mais urgente do que nunca. A proliferação de fake news e o uso impreciso de termos não apenas distorcem a realidade do Transtorno do Espectro Autista, mas também prejudicam a vida de milhões de pessoas. É imperativo que a sociedade busque informações confiáveis, valide as experiências autistas e adote uma linguagem que promova o respeito e a inclusão. Somente com conhecimento e empatia poderemos construir um ambiente verdadeiramente acolhedor para todas as pessoas no espectro autista, celebrando suas singularidades e garantindo seus direitos.