Criado em 2013 e descontinuado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), programa investirá em ações afirmativas para formação acadêmica no Brasil e no exterior.
O Ministério da Educação (MEC) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) recriaram o Programa de Desenvolvimento Acadêmico Abdias Nascimento, com o objetivo de promover a diversidade, inclusão e acesso na educação. Com um investimento de R$ 600 milhões, o programa visa formar pessoas estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades, assim como as pretas, pardas, indígenas, quilombola e do campo, tanto no Brasil como no exterior.
Neste artigo, exploramos o lançamento e funcionará esta iniciativa, que reafirma o compromisso do atual governo em garantir igualdade de oportunidades e combater as desigualdades históricas enfrentadas por grupos minorizados pela sociedade.
Boa leitura!
Investindo em inclusão e igualdade racial
Extinto em 2022, o Programa de Desenvolvimento Acadêmico Abdias Nascimento foi relançado em parceria com a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi), do Ministério da Educação (MEC), também reinstituída neste ano, para garantir ações afirmativas na educação. A Portaria nº 1.191/2023 ↗ foi assinada na última quinta-feira, 29 de junho, pelo Ministro de Estado da Educação, Camilo Santana.
“Da última vez que os recursos deste programa foram lançados era em torno de R$ 10 milhões e nós estamos colocando mais de R$ 600 milhões da Capes e do MEC. Isso mostra o compromisso deste governo, do presidente Lula, do MEC em garantir igualdade e inclusão. Nós sabemos a dívida histórica que este país tem com os negros, indígenas e quilombolas. Portanto, tudo que nós fizermos ainda será pouco enquanto políticas públicas, para garantir oportunidades para esses povos e essas comunidades em todo o país”, destacou o ministro.
A iniciativa reúne diversas ações afirmativas na pós-graduação stricto sensu com o objetivo de promover formação e capacitação, no Brasil e exterior, em universidades, instituições de educação profissional e tecnológica e centros de pesquisa de excelência.
“Estamos lançando os editais para que já possam ter acesso tanto para as ações no exterior e no Brasil. São diversas ações de pesquisa que nós vamos ter para acabar com o racismo estrutural que nós temos neste país e garantir mais equidade e igualdade”, ressaltou Camilo Santana.
O programa de inclusão e igualdade racial
Com investimentos de mais de R$ 600 milhões a Capes e a Secadi retomaram o Programa de Desenvolvimento Acadêmico Abdias Nascimento. Para o exterior, serão selecionados até 45 projetos de instituições de ensino superior, com prioridade para aquelas localizadas nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, além de municípios com Índice Médio de Desenvolvimento Humano (IDHM).
Os projetos devem abranger os seguintes temas: promoção da igualdade racial, combate ao racismo, difusão do conhecimento da história e cultura afro-brasileira e indígena, educação intercultural, acessibilidade, inclusão e tecnologia assistiva. Também podem estar relacionados à pesquisa e ao desenvolvimento de produtos, equipamentos, serviços e métodos destinados à autonomia das pessoas com deficiência e mobilidade reduzida.
Serão concedidas bolsas de mestrado e doutorado-sanduíche, além de recursos de custeio para estudos em universidades estrangeiras de excelência. A medida promove a cooperação internacional e estimula pesquisas para o desenvolvimento científico tecnológico e de inovação.
A proposta apresentada precisa ter, no mínimo, uma instituição brasileira e outra no exterior. O programa determina que, pelo menos, 50% das missões de estudo fora do país sejam realizadas por mulheres.
Recursos para formação, pesquisas e bolsas
Ao todo, a Capes investirá R$ 260 milhões ao longo de quatro anos. No Brasil, Abdias Nascimento terá o programa de desenvolvimento da pós-graduação, políticas afirmativas e diversidade, para apoiar projetos de formação de professores, pesquisadores e pesquisas acadêmicas científicas em diversas áreas do conhecimento.
As bolsas serão de mestrado, doutorado e pós-doutorado, e o investimento da Capes será de R$ 45 milhões durante cinco anos. Os projetos devem ser apresentados por professores ou pesquisadores vinculados a programas de pós-graduação de instituições de ensino superior de todo o país. As propostas devem ser sobre Tecnologia Assistiva na Educação; Interculturalidade; Políticas Indígenas e para Povos Tradicionais, Equidade, Inclusão e Avaliação de Ações Afirmativas.
Em outra ação, voltada à formação de professores, serão investidos mais de R$ 220 milhões, com o Programa Institucional de Bolsa Iniciação à Docência (Pibid) e o Plano Nacional de Formação de Professores em Educação Básica (Pafor).
O Abdias do Nascimento também destinará mais de R$ 56 milhões para o desenvolvimento de práticas inclusivas na sala de aula e mais de R$ 23 milhões para tutoria em língua portuguesa voltada para estudantes indígenas. Já a Secadi destinará R$ 40 milhões em quatro anos e programas preparatórios para pós-graduação.
Escolas públicas e cursinhos comunitários
No evento realizado na sede da Capes, em Brasília (DF), o ministro anunciou que para garantir a inclusão no país, em breve será lançada uma grande política nacional de inclusão nas escolas públicas. “Estamos preparando e concluindo esse projeto”, disse.
Camilo Santana recebeu e conversou, pela manhã, com mais de 80 jovens de cursinhos comunitários, destinados a estudantes de escolas públicas:
“Ouvi experiências e depoimentos de jovens que mudaram as suas vidas, viraram professores. Essa é uma política que garante a oportunidade e esperança para os jovens neste país. O MEC vai apoiar essa política, oficialmente, para garantir a oportunidade de acesso dos nossos jovens negros e negras, quilombolas, e indígenas”, anunciou.
Importância de reconstruir o programa
Na abertura da cerimônia, a secretária da Secadi, Zara Figueiredo iniciou sua fala lembrando que uma menina negra de 11 anos fez uma reportagem de jornal comunitário com seus três irmãos, em 2017, que mostrava o descaso público com o bairro onde morava. Segundo Zara, a menina que hoje tem 16 anos, sonhava em ser jornalista e conhecer a repórter Glória Maria. A secretária convidou a jovem Mirela Arcangelo para ser mestre de cerimônias do evento.
“Ela continua sonhando em ser jornalista. A reestruturação do Programa Abdias Nascimento, obviamente, não tem nenhum caráter salvacionista, mas em larga medida, foi pensado para meninos e meninas negras, do campo, indígenas, quilombolas, em situação de deficiência, surdo bilíngue, para que eles possam ter perspectivas futuras reais”, enfatizou.
Quem também falou sobre a importância do programa para aumentar a representatividade e a inclusão na educação, foi a secretária-executiva do MEC, Izolda Cela:
“Essas ações e um programa como esse são muito importantes porque abrem essa frente da representatividade na ciência, na graduação, na pós-graduação e na internacionalização”, disse.
Passado e futuro das políticas afirmativas
Para as pessoas estudantes e potenciais participantes do programa, a presidente da Capes deixou um recado:
“As próximas décadas serão definidoras para a humanidade. O envolvimento e a mobilização crescente de jovens na escolha de novos caminhos nos trazem a esperança de que novos destinos são possíveis para a sociedade, a economia, a política e o meio ambiente. Em vocês, os conceitos de educação como um bem global e para todos e ciência para o benefício de todos devem permanecer vivos”, disse.
A viúva de Abdias Nascimento, Elisa Larkin Nascimento, falou sobre a sua luta na defesa dos direitos dos negros, indígenas e quilombolas, quando foi deputado no Congresso Nacional, como a criação do Dia Nacional da Consciência Negra, a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas, a criminalização do racismo, a definição do racismo e da discriminação racial, e do racismo como crime qualificado.
“São 40 anos da proposta das políticas afirmativas para as populações excluídas e da inclusão dessas populações, e 20 anos da instituição da Lei de Cotas”, afirmou.
Participaram do relançamento do programa diversos parlamentares, estudantes, professores e representantes de ONGs e instituições que lutam pelos direitos dos negros, indígenas e quilombolas no país.
Logomarca baseada em obra de Abdias
Já a presidente da Capes, Mercedes Bustamante, agradeceu a toda equipe e diretoria da Capes que trabalhou para reconstrução do programa: “Sete anos depois, resgatar ações e iniciativas afirmativas da Capes comprometidas com a redução de iniquidades é uma honra para mim como servidora pública federal”, afirmou.
Mercedes informou que a logomarca do programa é baseada em uma das obras de Abdias Nascimento, que começou a pintar em 1968:
“Essa obra, o ideograma Adinkra, é de 1992. Adinkra são símbolos que representam provérbios e aforismos da escrita Akan, na África Ocidental. Existem centenas de símbolos e a maioria deles é de origem ancestral, sendo transmitido de geração em geração. A escrita de símbolos Adinkra reflete um conjunto de valores que forjaram a resistência e um sistema de valores humanos universais como família, integridade e tolerância, completou.
Quem foi Abdias Nascimento?
Abdias do Nascimento foi um influente ativista, intelectual e artista brasileiro nascido em Franca (SP) em 1914 e falecido em 2011, no Rio de Janeiro. Ele foi um defensor incansável dos direitos civis e da igualdade racial no Brasil. Fundador do Teatro Experimental do Negro, dedicou-se a promover a cultura negra e combater o racismo por meio das artes. Como político, atuou como deputado federal e lutou por políticas públicas que combatessem a discriminação e promovessem a igualdade de oportunidades para os afro-brasileiros.
Sua produção intelectual abordou temas como identidade negra, cultura afro-brasileira e o legado da diáspora africana. A trajetória de Abdias do Nascimento foi fundamental para o fortalecimento do movimento negro no Brasil e para a conscientização sobre as desigualdades raciais no país. Seu legado perdura como um exemplo de resistência e luta pelos direitos humanos.
Da Equipe de Redação