Pessoas com deficiência visual aprendem a ler e escrever em braille criando o próprio material, grupo em aplicativo de mensagem e plataforma acessível
Empresária diagnosticada com doença degenerativa aos 23 anos e hoje com 10% da visão, Daniela Reis Frontera ensina o Sistema Braille online à distância e de forma gratuita para pessoas com deficiência visual. Ela criou o projeto Enxergando o Futuro ↗, que está com inscrições abertas para a sua 36ª turma.
Boa leitura!
Braille online
As aulas do curso de alfabetização em braille são realizadas em uma plataforma online e acessível, com grupo em aplicativo de mensagem e material pedagógico criado de forma artesanal. Em média, segundo a assessoria de imprensa, as pessoas levam cerca de dois anos para concluir o curso.
Para a idealizadora e multiplicadora do projeto, poder ler também é uma forma de inclusão e o braille é o caminho para isso:
“Ele é a cartilha das pessoas com deficiência visual, principalmente, das crianças que nascem cegas, que, ao se alfabetizarem pelo método, conhecem o mundo por meio desses pontinhos. Com o braille, conquistamos a autonomia necessária para a nossa qualidade de vida”, afirma Daniela Reis.
Inscrição e matrícula
Para se inscrever de forma gratuita no curso, a pessoa interessada deve entrar em contato pelo WhatsApp (14) 99740-8217 e registrar a matrícula. Na sequência, ela será adicionada a um grupo no aplicativo de mensagens, com o número máximo de 20 participantes, onde as administradoras voluntárias explicam o passo a passo com todas as orientações para acessar a plataforma online do curso.
Como o curso funciona
O ensino é dividido em três módulos. No módulo 1, são enviados conteúdos em áudio e em vídeo ensinando a produzir o próprio material pedagógico que será utilizado no curso. Será uma produção artesanal com materiais como tampas de garrafas, bolinhas de gude ou de papel, além de espuma vinílica acetinada (E.V.A). Esta etapa exige o apoio de um vidente (familiar ou outra pessoa), para assistir aos vídeos e ajudar nessa produção inicial.
Quando todas as pessoas do grupo estão com o seu material pedagógico pronto, é iniciada a liberação dos módulos que ensinam a ler através do método braille. São ensinadas as primeiras letras, primeiras sílabas e como formar as primeiras palavras. A plataforma do Enxergando o Futuro descreve em áudio todos os passos para que os alunos consigam executar as atividades.
Depois que a turma postar no grupo aquilo que fizeram, as administradoras devem fazer todas as correções necessárias. Na plataforma do curso tem um passo a passo que ensina como fazer essas fotos e vídeos, caso alguém não esteja familiarizado com esses recursos.
Próxima etapa
No módulo 2 as pessoas terão contato com a prancheta, que é outro material pedagógico que consiste em uma folha de papel mais espesso que o sulfite, e a punção, que é uma espécie de pinça para furar o papel e, assim, escrever em braille.
Primeiramente, os alunos colocam em prática o que aprenderam com o material pedagógico e a ler as palavras escritas em braile nas regletes. Esta é a etapa de desenvolver o tato.
Último módulo
Já na próxima etapa começam a escrever em braile usando a reglete e a punção. Da mesma forma, os alunos seguem postando suas atividades na plataforma para correção das administradoras. Quem não têm condições financeiras para comprar a prancheta, pode receber sem custo o material do projeto Enxergando o Futuro, que busca doações na comunidade.
Ao entrar em um estágio mais avançado, os alunos entram no módulo 3, onde cada um recebe uma apostila em braile idealizada pela fundadora Daniela. Nesta etapa, as aulas são individuais e por vídeo através da plataforma Zoom, para que cada um exercite o aprendizado nas modalidades leitura e escrita.
Como nasceu o projeto
Quando sentiu dificuldade para encontrar um profissional ou instituição que a alfabetizasse no sistema braille, a empresária Daniela Reis Frontera, hoje aos 49 anos e só 10% da visão, não imaginava que a promessa de ensinar o método a outras pessoas com deficiência visual transformaria tantas vidas.
O projeto foi lançado em 2019, quando as aulas gratuitas eram presenciais. “Começamos na minha cidade, Duartina, interior de São Paulo, com dez alunos. Contudo, em março de 2020, com o início da quarentena, as atividades tiveram que ser suspensas”, lembra a empresária.
Plataforma acessível: a solução
Com intuito de dar continuidade ao ensino interrompido pela pandemia, Daniela se uniu ao amigo e coordenador do projeto Ricardo Barreiros. Juntos, eles lançaram uma plataforma que possibilita acessar o treinamento e o material educativo, assim como receber orientações.
“A aceitação dos alunos foi imediata e os resultados começaram a aparecer rapidamente. Atualmente, mais de 240 alunos de 24 estados brasileiros, além do distrito federal, têm acesso ao projeto”, comemora a idealizadora.
Com uma plataforma totalmente acessível e gratuita, as pessoas com deficiência visual podem iniciar a alfabetização em braille passo a passo.
“Foi um desafio e tanto! No início houve rejeição, algumas pessoas não acreditavam no ensino a distância. Porém, em três meses passamos de dez para 100 alunos. Hoje, deficientes visuais de Portugal, África do Sul, Inglaterra, Suíça, Portugal, Guiné-Bissau, Moçambique e Cabo Verde iniciaram suas aulas por meio da plataforma. O projeto cresceu, mas queremos mais”, comenta.
De acordo com o último censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), cerca de 6,5 milhões de habitantes têm algum tipo de deficiência visual. No Sudeste, 3,1% da população é afetada, ou seja, cerca de 2.508.587 de pessoas têm cegueira ou baixa visão. “Portanto, tem muita gente para alcançarmos ainda”, conclui.
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