Presentes no “Devs de Impacto”, especialistas defendem que a tecnologia só será justa se for treinada com diversidade para atender às 18,6 milhões de pessoas com deficiência no país.
Curitiba, PR, 06 de novembro de 2025 – A onipresença da Inteligência Artificial traz consigo uma promessa de futuro e um risco iminente: o de automatizar os preconceitos e a exclusão já enraizados na sociedade. Para especialistas presentes no evento “Devs de Impacto” em Curitiba, o antídoto está em sua concepção: treinar os algoritmos para que entendam a deficiência não como uma falha a ser corrigida, e sim como mais uma característica inerente à diversidade humana – um desafio ético e tecnológico urgente em um país com 18,6 milhões de pessoas com deficiência, segundo dados da PNAD Contínua (IBGE/2022) .
Esse risco, chamado capacitismo algorítmico, ocorre quando sistemas de IA são alimentados por bases de dados que refletem preconceitos históricos ou projetados sem a participação de pessoas com deficiência. Na prática, isso pode resultar em ferramentas que discriminam e invisibilizam esse grupo ou assistentes de voz que não compreendem diferentes padrões de fala, entre outros, automatizando a exclusão em larga escala.
O Desafio da Representatividade: Treinando a IA para um Brasil Diverso
A provocação central veio do influenciador e ativista Deives Picáz, conselheiro do Pacto Global da ONU no Brasil, durante sua participação no hackathon organizado pelo iMasters . Para ele, o desenvolvimento de uma IA justa e eficaz passa, necessariamente, pela inclusão de perspectivas diversas desde a sua origem.
“A gente precisa treinar a inteligência artificial para entender que a deficiência não é um problema, ela é uma característica humana. E que pessoas com deficiência, por serem diversas, resolvem problemas de maneiras diversas.”
Deives Picáz, conselheiro do Pacto Global da ONU no Brasil
A fala de Picáz ecoa uma preocupação global: se os algoritmos são treinados com bases de dados que não representam a totalidade da população, eles tendem a replicar e amplificar vieses. No Brasil, onde a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua de 2022 aponta que 18,6 milhões de pessoas (8,9% da população) têm alguma deficiência, ignorar essa realidade na construção de novas tecnologias significa criar um futuro digital inerentemente excludente.
Da Competição à Mentoria: A IA como Ferramenta de Inclusão na Prática
A importância de múltiplos olhares no processo de desenvolvimento foi reforçada pela presença de Débora Mathias, designer e mãe de uma criança autista, que atuou como mentora no evento. Tendo participado recentemente de outro hackathon, o Autismo Tech 2025, como competidora, ela vivenciou os dois lados do processo de inovação.
“Transitar entre os papéis de mentora e participante é uma experiência completa que envolve encontrar o problema, ser criativo e incorporar a inovação. Tornar os aplicativos e sites acessíveis a todo mundo é super importante para que a gente possa promover a inclusão como um todo.”
Débora Mathias, designer e mentora
Clima e Impacto Social: A Tecnologia a Serviço de Múltiplas Causas
Embora o debate sobre inclusão tenha sido um dos destaques, o tema central da edição de Curitiba do Devs de Impacto foi o clima. O desafio proposto aos 59 desenvolvedores era criar soluções de IA para problemas sociais relacionados a questões climáticas. A equipe vencedora, formada por estudantes do Inteli de São Paulo, desenvolveu o “Clima Seguro”, um sistema que utiliza modelagem matemática para estimar o risco de desastres climáticos em diferentes regiões do país, demonstrando o potencial da tecnologia para gerar impacto social positivo em diversas frentes.
O Futuro do Desenvolvimento com Inteligência Artificial
A série de hackathons, que conta com apoio da OpenAI e da NewHack, continua a percorrer o Brasil. A próxima edição do Devs de Impacto está marcada para os dias 8 e 9 de novembro em João Pessoa (PB), onde novas soluções de Inteligência de Artificial e debates sobre o futuro da tecnologia e da sociedade devem emergir. A presença de discussões sobre diversidade e inclusão em eventos focados em desenvolvimento tecnológico é um sinal positivo de que a comunidade de tecnologia está, cada vez mais, ciente de sua responsabilidade na construção de um futuro mais justo e acessível para toda a sociedade.
